14.2.06

Dérision (La)

Vaidosa das raízes célticas, não me afectaria celebrar um qualquer santo. Do que rio é do imbecil seguidismo digno de processionárias que, embarcando em tudo o que propicie o postiço, o objecto inútil, o langorosamente hipócrita, faz com que milhões de seres humanos celebrem este dia. Como se o "sentimento do A grande" não fosse inerentemente impositivo às meninges; como se realmente aquela pessoa se interessasse pela pessoa em causa como interessa que se interesse. O que é hoje esse sentimento aqui no reino da Babilónia que é o habitat do animal mais destrutivo?...
Não passará, afinal, da mesma gula que levou hoje tantas crianças a beijarem-se nos corredores da minha escola, corpinhos colados a paredes, rubores crónicos, um autêntico concurso que faria sorrir, não fora o respeito pela tal "liberdade de expressão" que tantos bloggers nem imaginam que as suas criancinhas já exercem, à custa de muita ondulação de mãos sob camisolas, salivas trocadas e a troça ou ciúme de centenas de outros miúdos com 14, 13, 12, 11 verdes aninhos ... Constrangedor, não conseguindo chegar à minha ideia de ternura. Hormonas, nada mais do que hormonas. Isso é bom, é saudável, mas... em público? Considerando-me uma muito sensitiva e liberta mulher na intimidade, repugna-me a ideia das manifestações de desejo em público. Por que terá tudo de ser tão banalizado, tão coisa pública, tão minimizador dos heróis por 10 minutos? Arraiais, feiras baratas, as manifestações públicas, tanto mais que sei de muitos pares em que um dos elementos só mostra calor humano em público, vivendo o outro à míngua de afecto, de toque, de noites de atenção exclusiva, de um sorriso cúmplice... Aprendi que quanto maior é a exibição, mais pobre será o desenrolar de qualquer acto mais íntimo... Não há fantasia, não há sensualidade, não há dádiva real. Fachadas, para impressionar a tribo urbana, diria, talvez, Desmond Morris.
O meu riso de troça vai para todos os pobres de espírito que, não resistindo às rotinas, precisam que o calendário lhes aponte os dias supostamente extraordinários.
Castigo: fazerem de um destes dias (manhã, tarde, noite, madrugada e seja qual for o local) a súmula perfeita do mais ternurento, sensual, tórrido momento de amor das próprias vidas e da vida do parceiro! Em caso de recidiva, aumentar as doses e prolongar por mais dias. Sem datas marcadas, dizer-se: «É hoje!».
Já aqui pus músicas de Bryan Ferry e dos Roxy Music. Agora, tomem lá Mr. Bowie e saibam que vale a pena esperar que o som chegue para que tantos desimaginosos e pãezinhos sem sal percebam uma fundamental verdade: This Is Not America...
Bem, ainda não, mas com tanta ajudinha das massas acéfalas já faltou mais...


Beijos fraternos (os outros estão reservados e eu não sigo efemérides!).

;0)

2 comentários:

Anónimo disse...

Inês,
Passei por aqui e gostei. Gostei muito. Comecei por cima, vim descendo e, quando terminou, lembrei-me daquela cena do Paris Texas, eu dum lado, você do outro, e a luz a falhar naquele momento, para agravar, ainda mais, a sensação de vazio por este contacto ter terminado. Depois voltei a subir para deixar este comentário junto ao seu fragmento onde se deixa antever.
Enquanto durou senti-me a percorrer as suas ruas e vielas interiores e, aos poucos, a desenhar uma imagem de uma pessoa rara: inteligente, perscutando à sua volta, como aconselharia Popper, balzaquiana precoce, mas com uma razoável experiência de vida e uma história para contar. E com que segura elegância o faz! sabe qual o seu papel no mundo, conhece as suas raízes, onde está e, não estou tão certo, para onde vai, mas, curiosamente , ou não tanto, é não ter perdido, ainda, a ansiedade da adolescência. Virgem com ascendente aquariano? Isso explica muita coisa...
Voltarei. Um ramo de rosas para si!

Anónimo disse...

Agradeço a gentileza, "Anonymous".

Creio que me tresleu: onde me referi eu a "virgem com ascendente aquariano"?... Ser caranguejo com ascendente balança, isso sim, explica tudo! ;0)

Escrevo para os meus leitores: se voltam é um bom auspício. Quanto ao que escrevo, não confundir a ficção com a realidade!
Creio que a generosidade lhe confere algum exagero ao texto mas seja bem vindo: temos poeta!
:0)


1 abraço.
Inês.