21.2.07

(Re) legado [para um outro plano] divino (?)

de 03 Outubro 2006

Legado

Perguntou a um velho:
- A quem dou todo o amor que trago no peito?
Ele olhou-a, vazio, deu aos ombros, voltou costas, a caminho da morte.
Perguntou a uma mulher que passava:
- A quem dou todo o amor que trago no peito, que o estala de dor, que me consome?
Ela sorriu e ignorou, cínica, vivida de corpo, vazia de mágoas, um pergaminho de casos.
Perguntou a Deus que a observava:
- A quem dou, Pai, todo o amor que trago no peito, que me escala em úlceras de dor?
Deus permaneceu insone, olhou condoído mas não sabia o que se faz a essa planta trepadeira que se instala no peito humano com raízes até ao pensamento, guiando os passos até ao outro corpo.
Perguntou ao tempo, à centelha da vida, ao vento norte:
- O que faço a tanto amor que me transborda, como o dou, a quem chamo, como gasto esta força que me devora e me dá luz aos olhos, me humedece cantos à boca, me estende os lábios na direcção daquele que me teleporta o corpo a todo o seu calor, me esventra a alma e se apossa dos mais ínfimos minutos do dia, suga da noite todos os sonhos, me devora de olhares acesos perante os olhos do mundo, me chama a si desde o primeiro segundo em que o mesmo ar inalámos?
O tempo não podia perder-se, a centelha divina cumpria-se a cada respiração e refluxo sanguíneo até que o tempo a impedisse, o vento norte corria, lesto, levando cabelos de amantes, águas das marés, enlaces de dedos desfeitos, lágrimas de gente que não sabe o que fazer do amor, mar alteroso.
Decidiu ignorar. Ainda hoje procura por si, altiva, perfeita, volvida fortaleza porque não sabia o que fazer do único ser que chega sem que o chamem e se instala, petrificante se instala no peito e se traz dentro, pesado, até que um outro corpo o reclame. Os humanos não se apercebem das vozes que lhes povoam a caixa entre a cintura e os olhos. Aí, ardem Tabernáculos, aí, a Arca da Aliança, aí, esse singelo amor que, em sendo tanto, tolhe o discernimento e cobre de pétalas violeta os olhos que esperam barcos. O cais são os dias todos.
Desta (de) sempre: Inês Alva

15.2.07

:D e volta



Boa noite, mundo!


Amei... e sobrevivi.

A insensatez esporádica

sempre me marcou no calendário os melhores dias.


Obrigada por terem visitado esta casa do farol!


Beijos cálidos,

agridoces,

infinitesimais de tão homeopáticos.

Lentos de mais nas aproximações, como convém.


[Hitchcock explicaria, Freud não]
Pelas imagens supra, percebe-se por onde andei?...
;0)

5.2.07

Aviso quid pro quo



Há pão na caixa. Há assado no forno.
Não te metas no 1º da 2ª;
Quanto à 1ª,evita as migalhas, sim?
Como é óbvio, estarei a dormir.
Deixa-me em paz:
acorda-me e faz amor comigo!
;0)

4.2.07

A mulher sadiM

Midas no seu inverso, ela nasceu para excretar. Com várias provas dadas, tudo o que toca se dissolve em pó. Afigura-se-lhe útil o tempo gasto sobre o planeta e crê-se insubstituível pelo simples, nefasto, despiciendo lugar-comum: reproduziu-se. O talento foi o de uma noite com um aventureiro do asfalto. Arrasta agora o corpo e as fressuras de alma para pagar o alimento de mais uma boca. Para isso, dispõe-se a vender tudo o que não seja a carne do filho. De resto, nada lhe sobra de digno. O que oferece é digno de um freak show. Sejamos incoerentes: chamemos-lhe apenas mau gosto. Nada disto concerne o matusalém rei Midas. Pelo contrário e, por isso mesmo, ao contrário, na mesma proporção em que a crucificação de Pedro inverte a de Jesus Cristo: o primeiro passou o resto da existência seguindo um modelo muito acima de si; o segundo carecia de mortalidade. A "mulher sadiM" é a parca sobra da mulher de talento. Um homem vende-se; uma mulher sadiM prostitui-se. Excrementa-se na babugem das noites. Desce, degrau a degrau, a escadaria entre O Dom e a banalização engargulante. Não importa o que lhe chame, ela embute nas suas fauces o preceito budista: «Tudo é vazio saído do vazio». Assim viveu, assim morrerá: nada a satisfaz, em nada evolui enquanto a sua única fome for a de ego satisfeito. Vazio é o que procura, vazio é o que encontra. Os seus olhos nunca deixarão o pó do chão que pisa e vale mais o pó do que uma só das suas gotas vitais. Por isso apodrece tudo o que a rodeia: é sua função voltar ao húmus, não ascender.